quinta-feira, 24 de outubro de 2013

sobre a cultura Védica


    

Muitas vezes a verdade é ofuscada pela força de um mito. Em muitos casos isto pode acontecer mesmo que inúmeras evidencias provem que ele seja falso.  Vejo que isto acontece com a História da India. Fiz este texto contando o que aprendi sobre a história deste pais pela boca de seus habitantes e de seus autores. Ficou um pouco grande, mas não teve outro jeito.


             Questionamentos e evidências de uma tradição milenar

A maneira mais apropriada de se conhecer a história de uma cultura, ou pais, é por seus próprios habitantes. Dês de minha primeira viagem a Índia venho reaprendendo quase tudo que achava que sabia sobre ela. A índia contada por ela mesma diverge em inúmeros aspectos do que eu, até então, havia aprendido por livros de autores ocidentais. Felizmente sua cultura milenar continua viva em muitos de seus cidadões que ainda preservam suas origens. Esses cidadãos são, em minha opinião, os maiores tesouros deste país. Mesmos nas grandes cidades, que já se encontram bastante modernizadas, é possivel encontrar muitas pessoas que ainda vivem e cultivam hábitos ancestrais e mantem viva tradições, filosofias e práticas que são repassadas de geração em geração.
Certa vez, pesquisando material para estudo em uma pequena livraria, deparei-me com um livro que trazia informações sobre datas e acontecimentos diferentes das que eu conhecia. Um tanto confuso, procurei aucílio a única vendedora do lugar para checar a ceriedade do livro. Ela achou oportuno me apresentar a um professor da universidade de Chennai que alí também se encontrava para que eu mesmo o endereçasse minhas dúvidas.
Essa converça me fez repensar a Índia. Este senhor vestia-se apenas com um pano enrrolado no corpo, a uma maneira típica e ancestral, e possuia o corte de cabelo e as marcas pintadas na testa que o identificavam como um Bhranmani Vaisnava. O fato dele estar visualmente semelhante a figura de seus  ancestrais representava para mim uma porta para o passado. Com paciencia ele contou um pouco da hisória de seu povo e as contradições que existem entre a versão da sustentada segundo a crença da tradição oral milenar Índiana e a da teoria moderna do mundo contada por ocidentais para esplicar seu próprio país. 

 A autenticidade dos Vedas, durante um período da história, chegou a ser questionada. Em 1805, o alemão Friedrich Shlegel, novelista e homem do estado, apresentou sua teoria em que afirmava haver uma grande similaridade entre o sânscrito, o persa, o grego, o celta, a língua germânica e eslava, sugerindo portanto que todas elas tivessem a mesma matriz. Esse estudo gerou grande especulação. A partir daí começaram a nascer teorias migratórias, entre elas a de que a Índia teria sido invadida por um povo estrangeiro que trouxe consigo essas raízes linguísticas e que teria migrado de algum lugar da Ásia Central por volta de 1.500 A.C. Posteriormente, em 1819, Shlegel usou o termo Aryano para classificar esta raça que além da Índia também teria migrado para diferentes partes do globo. Na Índia, os Aryanos teriam chegado pelo noroeste, se estabelecendo inicialmente onde hoje é o estado de Punjabi e ocupando, posteriormente, a planície do Ganges. Segundo este pensamento a cultura védica teria sido trazida com esse povo ou nascido da fusão entre o povo invasor e o nativo.
Essa versão acabou sendo aceita pela maioria dos historiadores europeus. Mas devido à falta de evidências concretas, nunca existiu um consenso em relação ao local de origem desse povo Aryano. Historiadores divergiram entre Anatólia (parte central da Turquia), Irã, Europa (criando o termo indo-europeu) e até mesmo Atlântida, mas nunca nenhuma teoria foi convincente o suficiente para ser tomada como verdade. A resposta para esse questionamento sempre foi um grande mistério. Isso porque a Índia sofreu grandes invasões e é possível datar e identificar a origem de todos os povos que para ela migraram. A única dúvida persistente é em relação a terra de origem dos Aryanos. No sec. 5 A.C o império Aquemênida invadiu o leste do Afeganistão e quase todo Paquistão, estabelecendo o império Persa até a próxima invasão em 334 A.C quando Alexandre estendeu seu império até o estado indiano de Punjabi. A partir do sec. 8 árabes omíadas foram gradativamente chegando à Índia e introduzindo a cultura islã. Em 1526 Badur, de origem turco-persa-mongol, estabeleceu o império Mogol, até finalmente o império Britânico assumir o controle da Índia a partir de 1858.
A Inglaterra, então colonizadora, e os padres missionários, foram os grandes propagadores da teoria Aryana. A Índia, que até então não tinha dúvida alguma sobre suas origens e autenticidade de sua cultura, viu sua rica e milenar história ser manipulada. Isso provavelmente aconteceu como uma manobra política dos colonizadores. Essa teoria conseguiu desunificar racialmente os Indianos. Ao norte identificaram-se os Aryanos, de pele mais clara, que teriam expulsado e pressionado os nativos, Dravidianos, de pele mais escura, para o sul. Além de criar idéias separatistas, essa teoria também questionava a grandeza da cultura Védica, pois a tornava estrangeira e, segundo os padres jesuítas, efêmera e imposta covardemente aos inocentes e legítimos nativos da Índia. Essa idéia foi massivamente difundida. Os livros escolares de história foram modificados e devido a essa forte imposição, com o passar dos tempos, ela inevitavelmente acabou sendo aceita pela maioria dos indianos.
No entanto, para religiosos e eruditos indianos, esse questionamento nunca existiu. Se por um lado a teoria de invasão Aryana era suportada pelo estudo de similaridade lingüística de Shlegel e a propaganda de estudiosos europeus e missionários religiosos, a cultura hindu sempre teve como provar sua autenticidade com evidências literárias, astrológicas e até mesmo arqueológicas. A importância de esclarecer esse assunto se deve ao fato de muitos livros sobre Yoga ainda trazerem como verdade o injusto mito sobre a invasão Aryana.
A literatura Védica não faz menção a essa suposta invasão. Dentro desse contexto literário, Aryano significa literalmente “pessoa nobre”. Ela não é relacionada a uma raça e sim a uma identidade. Aqueles que assumiam certos costumes, valores e códigos de conduta, formavam uma identidade Aryana. O cultivo dessas atitudes teria se difundido pela Índia e seus arredores, e não ao contrario. A Índia (hindustan), nome dado pelos invasores devido ao rio Indus pelo qual chegavam, era antes chamada por seus habitantes de Bharata, devido ao rei Bharat. Posteriormente chamava-se Aryavarta, residência dos Aryanos. Nenhuma outra região fora da Índia é mencionada no Rig Veda, além do Irã, governado por Yama, irmão mais novo de Manu Vaivasvata. Não existe mensão de uma terra natal fora da Índia.
Os textos Puranicos mostram uma linhagem sucessiva e inquebrável de reis originada no período do RIG veda. Manu Vaivasvata teria dado origem à sequência de dinastias que pode ser quase toda rastreada. Por exemplo, Rama, o protagonista do épico Ramaina, foi o sexagésimo-quarto a reinar na dinastia Suryavamsh, fundada por Ikshavaku. Yudhishthira, da dinastia Chandravamshis, foi coroado logo após o fim da guerra narrada no épico Mahabharata e reinou por 36 anos. Essa guerra entre os Pandavas e Kurus coincide com o inicio da era de Kali, que teria começado em 3102 A.C. A astrologia Védica também indica datas muito anteriores a suposta invasão Aryana. O Yajur e Athara Veda por exemplo descrevem um equinócio em Krittikas (plêiades, antigo touro) e um solstício de verão em Magha (antigo leão) referente a 2500 A.C aproximadamente.
Escavações feitas por Sir John Marshall entre 1920 e 1922, trouxeram à tona evidências para o fim dessa discussão. No deserto de Thar, no Paquistão, perto da fronteira com a Índia, foram descobertos as ruinas das cidades de Harapa e Mohenjodaro, construídas às margens do rio Indus e Saraswati. Estas cidades possuíam características peculiares e muito à frente de seu tempo quando comparamos com os Sumérios na Mesopotâmia (3500-2340 A.C), por exemplo. Elas apresentavam uma grande estrutura social e urbanística com casas com banheiros no segundo pavimento, piscinas comunitárias, sistema de esgoto e irrigação e uma grande produção artística e comercial. Estima-se que Mohenjodaro chegou a ter cinco milhões de habitantes, sendo portanto, o lugar mais populoso do mundo em sua época. A História e vestígios dessas civilizações podem ser apreciados no museu de Nova Delhi na Índia. Estas informações não são muito conhecidas já que pouquicimos estrangeiros tem a oportunidade de visitar este museu.
As características védicas nessas cidades são evidentes. Imagens de seres em postura de meditação, símbolos, vestimentas, objetos e altares de fogo védicos foram encontrados em diversos sítios espalhados pela região descritos exatamente como nas escrituras Védicas, o que comprova a ancestralidade dessa tradição que continua viva até hoje. Os cidadões e a cultura que alí existiam não desapareceram. O Centro urbano de Harappa, que existiu entre 3100 A.C e 1900 A.C, foi abandonada por sua população, que migrou para a planície do Ganges, devido à mudança do curso do rio que a abastecia.
Outro ponto importante é o fato do Rig Veda fazer alusão a esses centros urbanos e dedicar vários hinos ao extinto rio Sarasvati (RV II,41.16; VI 61,8-13), o mais volumoso entre os sete principais rios citados no Rig Veda. Estudos feitos no solo, onde existia o rio, revelaram que este secou 400 anos antes da suposta invasão Aryana sugerida no século XIX.
Para desfazer qualquer dúvida, basta se fazer duas perguntas: Se a teoria de invasão da Índia pela raça estrangeira Aryanos é verdadeira, por que um povo não iria colocar em sua principal obra literária, que é riquícima em detalhes, nenhuma evidencia cequer de sua terra natal? E, por que eles enfatizariam  o culto a um rio que já havia secado céculos antes de sua chegada?
Como acreditam os eruditos indianos, nunca existiu um consenso em relação à terra de origem dos Aryanos porque todas as evidências concretas indicam que estes pertenciam justamente à Índia.

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